Imagine uma cidade onde prefeitos, arquitetos, professores, empresários, enfim, todos os moradores olhassem para esse lugar como se cada um deles tivesse apenas 95 cm de altura? Esse é o desafio lançado pelo projeto Urban95: que os adultos vejam as cidades como o olhar de bebês e de crianças pequenas. Uma menina ou menino de três anos de idade tem, em média, 95 cm.
A ideia parece aquela cantada na música “A Cidade Ideal”, que está no disco Os Saltimbancos, de Chico Buarque, conhece? Principalmente a parte da letra que diz:
E, quem dera, os moradores
E o prefeito e os varredores
E os pintores e os vendedores
As senhoras e os senhores
E os guardas e os inspetores
Fossem somente crianças.
A diferença é que o Urban95 não quer uma cidade só com crianças, mas com adultos sensíveis a elas, porque podem ver como elas veem. E os adultos conseguem fazer isso de um jeito ainda mais fácil, sabe como? Basta lembrar que dentro de cada mulher e de cada homem vive uma criança também.
O projeto é uma iniciativa da fundação holandesa Bernard van Leer e acontece em Israel, no Peru, na Turquia, na Holanda, na Jordânia, na Índia e no Brasil. Por aqui, são 24 cidades, entre elas, Uruçuca e Ilhéus, no sul da Bahia.
Quando os gestores passam a ver as cidades com as lentes da primeira infância, esses lugares se tornam acolhedores para os primeiros anos de vida dos cidadãos”, explica a psicóloga Cláudia Vidigal, que representa a Fundação Bernard van Leer no Brasil.
As propostas nascem da escuta das comunidades. As crianças, as famílias, os cuidadores, todos são ouvidos e contribuem com os planos municipais pela primeira infância. Esses planos são documentos que reforçam o compromisso do poder público com meninas e meninos entre 0 e 6 anos. Cláudia observa: “Desde pequenininhas, as crianças percebem que são sujeitos políticos e que é muito importante participar da sociedade em que vivem”.
Em agosto de 2022, crianças de Uruçuca planejaram e realizaram uma intervenção urbana, que é quando a gente interfere na cidade. A ação aconteceu no bairro Venina Almeida e envolveu a diretoria de Cultura e as secretarias de Educação, de Administração e Finanças e de Infraestrutura, com apoio técnico da Rede Urban95/CECIP e consultoria de urbanismo do Laboratório da Cidade e da arquiteta Maia Lafer.
Tudo começou com dois processos de escuta, em que crianças e adultos foram ouvidos para dizer o que achavam de uma praça do bairro e como gostariam de transformá-la. A assessora Cecília Garcia conta que 40 crianças de 3 anos de idade, da creche Irmã Angelina, visitaram a praça, fizeram desenhos e disseram que queriam ter mais brinquedos e pinturas coloridas naquele lugar.
Com o projeto definido, os pequenos participaram de um mutirão, que é quando todo mundo se junta para fazer algo pelo coletivo. Desse mutirão também participaram famílias, educadores, gestores, arquitetos e urbanistas.
Juntando crianças e adultos, sabe o que aconteceu? Construção de brinquedos, de bancos e muitas pinturas. As crianças também sugeriram que o piso da praça fosse colorido e cercado para evitar que carros e motos passassem por ali. Hoje, a praça vive cheia de crianças, vindas até de longe, para brincar em um espaço transformado por gente pequena também.